(Con)vivendo com o transtorno mental em O Lado Bom da Vida

30 de junho de 2020


Foto: Paris Filmes / O Lado Bom da Vida / Divulgação

No filme “O Lado Bom da Vida” (2012) acompanhamos o recomeço de Pat, que após sair de um período de internação psiquiátrica, tenta voltar a vida que levava antes da internação, mas acaba descobrindo que os espaços que antes ocupava agora não lhe cabem mais. Por conta do incidente que levou a internação, não pode mais se aproximar do local que trabalhava e nem ter contato com a esposa, assim indo morar com seus pais. Ele e seus pais começam então a tentar entender o que é (con)viver com o transtorno bipolar. 

Pat precisa lidar com as confusões e desorganização em sua mente, enquanto tenta controlar sua agressividade e impulsividade, muitas vezes sem sucesso. As oscilações de humor são frequentes e por vezes precisa checar se o que ouve é real ou está na sua cabeça, afinal, já teve alucinações e delírios antes, então não consegue mais confiar na própria percepção e julgamento. Aderir ao tratamento é difícil, pois não quer falar do que o incomoda e não gosta de ter que sentir os efeitos colaterais da medicação.
 
Por outro lado, os pais precisam de paciência com as crises do filho, que ocorrem em momentos imprevisíveis, sendo as vezes em horários inoportunos, assim afetando a rotina da casa como um todo. Ainda assim, tentam procurar formas de integrá-lo em suas atividades e incluí-lo na rotina da casa. Seu irmão também fica sem saber se pode contar sobre suas realizações para Pat, até mesmo sem saber agir muito bem no início, mas Pat está disposto a tentar mudar sua vida, mesmo que erre algumas vezes tentando isso. Todos estão passando por uma fase de adaptação, a família como um todo precisa repensar sua dinâmica para tentar criar um ambiente seguro e saudável, dentro do possível.

E é quando um amigo apresenta sua cunhada para Pat que algumas mudanças começam a acontecer. Tiffany está vivendo um luto patológico, se apresentando uma pessoa instável e agressiva, sem traquejo social. A morte do esposo mudou seu comportamento, deixando sua família preocupada. Mas encontrar com Pat, e suas tantas falas inadequadas, chamou sua atenção, assim oferecendo sua ajuda a ele em troca de que ele a ajude em um concurso de dança.

A dança deu a Pat um compromisso, um objetivo, uma possibilidade de recomeço, de se ver e ser visto além do transtorno. Ele conseguiu estabelecer uma rotina, manter a corrida para perder peso, algo que sua esposa sempre havia lhe pedido, e criar laços com Tiffany. Suas crises diminuíram, ele passou a ter mais esperança no lado bom da vida, até começou a aderir ao tratamento, tanto por conta da rotina de treinamentos da dança, quanto por se permitir se abrir para Tiffany. Seu novo lugar no mundo começou a se construir passo a passo, no seu próprio ritmo.

O desafio de Pat é enfrentado por muitas pessoas que sofrem com transtornos mentais. A adaptação a vida com o diagnóstico é cheia de desafios, tanto para quem apresenta o transtorno quanto para a família, os amigos, a rede de apoio. Passar por uma internação psiquiátrica gera estigmas, ainda há muito preconceito e há pessoas que se aproximam pela curiosidade, sem oferecer uma real ajuda. Há também aqueles que se afastam, por não se sentirem aptos a conviverem com o transtorno. Porém, um diagnóstico não é o fim da vida, muito pode ser construído se a pessoa e sua rede de apoio estiverem abertos a fazer adaptações, repensar a vida e o jeito de viver. 

Cada um precisa criar suas estratégias para lidar com as dificuldades, buscar ajuda quando necessário, independentemente de ter um diagnóstico psiquiátrico ou não. A vida por si só já é cheia de desafios, daí a importância de ver o humano, o ser que está ali na nossa frente, a si mesmo(a) e ao outro. Viver é aprender a conviver com as nossas dificuldades, por isso a paciência e a disposição para entender a dificuldade do outro abre o espaço para ver o positivo, o tal lado positivo que Pat passa o filme buscando em cada momento. Pois, com ou sem diagnóstico, todos sentimos e temos o direito de procurar espaços para ocupar na sociedade. Alguns terão mais facilidade, outros mais dificuldade, o importante é se permitir se abrir para aquilo que nos faz bem e caminhar no ritmo que dermos conta.

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Sheila Francisca Machado reside em Brasília, é psicóloga clínica, especialista em psicologia clínica e especializada em avaliação psicológica, CRP 01/16880. Atende adolescentes e adultos na Clínica de Nutrição e Psicologia - CLINUP. Atua com a abordagem Análise do Comportamento.
Contato: sheila_machado_@hotmail.com
Clínica Clinupclinup.blogspot.com
Instagram@empqnasdoses

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