Operação Supletivo - Agora Vai! e a luta contra a dificuldade escolar

28 de maio de 2021

Foto: Universal Pictures do Brasil / Operação Supletivo - Agora Vai! / Divulgação.


 Em “Operação Supletivo – Agora Vai!” (2018), começamos o filme acompanhando Teddy se preparando para fazer a prova final do Ensino Médio. O problema é que Teddy não é um aluno de boas notas, ao contrário, notas vermelhas é o que ele mais tem. Seus pais, na tentativa de incentivá-lo a estudar, o comparam com sua irmã gêmea que tem ótimas notas, o que não ajuda nem um pouco Teddy a se sentir capaz de fazer a prova. Teddy e todos a sua voltam o veem como uma pessoa preguiçosa e incapaz.

No dia da prova, Teddy está nervoso e percebe alguns olhares de colegas da turma. Na hora que autorizado a começar a prova vem um baque: as questões parecem saltar da página e o atacar, embaralhando números, letras e palavras. Teddy começa a lutar contra esse ataque, mas decide gritar sua derrota: levanta da cadeira, grita em meios aos colegas que suas notas não o definem e que estava abandonando a escola. Vemos ali um problema que até hoje acontecem em vários lugares do mundo: a evasão escolar no ensino médio.

Teddy era bom nos esportes, tinha uma boa desenvoltura social, mas não lidava muito bem com o tipo de inteligência que é normalmente valorizado e ao qual a escola se dedica a avaliar como o principal para se ser ensinado: o raciocínio verbal e o raciocínio matemático. Por mais que atualmente busque-se valorizar também outros tipos de raciocínio, o foco escolar é em um ensino ainda tradicional voltado principalmente ao raciocínio verbal e matemático. Esse sistema favorece quem tem mais facilidade com esses tipos de conteúdo e quem tem uma boa capacidade de memorização, sendo deixa em segundo plano o raciocínio crítico, artístico, social, entre outros. 

Além do mais, na escola conteudista padrão os alunos são vistos de forma homogênea. A quantidade de conteúdo da grade curricular dessas instituições de ensino visa muito mais preparar o estudante para a prova do vestibular do que preparar para a vida. Essa busca das instituições em cumprir com uma ampla carga de conteúdo, que também visa atender a expectativas dos pais e responsáveis, acaba atrapalhando um olhar mais individual sob cada aluno. O aluno que não dá conta da quantidade de conteúdo passado acaba sendo deixado em segundo plano. Isso atrapalha o encaminhamento a avaliações de profissionais que seriam capazes de identificar dificuldades de aprendizagem. Com isso, a escola não tem espaço para todos e muitos Teddys estão espalhados por aí. 

17 anos depois, acompanhamos Teddy como um ótimo vendedor. Sua desenvoltura social e habilidades de comunicação o auxiliam em seu trabalho. Seu chefe deu uma chance a ele mesmo sem ter o diploma de ensino médio. Além disso, namora com uma mulher vista como bem-sucedida e estudada, com uma renda superior à sua. Assim, Teddy faz de tudo para impressioná-la, mesmo que isso signifique viver uma vida financeira que ele mesmo não é capaz de arcar e fingir que concluiu o ensino médio. Se tornou um adulto com baixa autoestima, que busca a todo custo agradar as pessoas mais próximas e provar para a sociedade que é bem-sucedido.

Após um acidente na loja, Teddy fica sem emprego e para conseguir um bom novo emprego é obrigado a fazer supletivo. Então, retorna para escola em que estudava para se matricular no supletivo, mas tenta usar sua lábia para conseguir o diploma sem precisar de estudar, porém, sem sucesso. Se vê em uma sala com outras pessoas que também tem suas dificuldades e com uma professora jogo duro, disposta a fazer com que todos aprendam.

Contudo, Teddy ainda quer procurar atalhos. Voltar a estudar o colocou a frente de letras e números que o atacam sem pensar duas vezes. Podemos ver em vários momentos do filme uma ilustração do que é para uma pessoa, que como o Teddy, tem alguma disfunção de aprendizagem. Quando há algum problema de processamento da informação, as palavras podem não fazer sentido, ou a sequência de palavras parecem se embaralhar na sua frente. Letras e/ou números podem aparecer trocados, o que dificulta ainda mais o entendimento correto do que está sendo pedido. Uma frase que parece simples para muitos, para quem tem dificuldade parece estar o atacando.

E assim como Teddy, vemos vários adolescentes e adultos que sentem vergonha de admitir que não entenderam o que leu, que algo que foi dito parece confuso, se sentem incapazes de aprender, pois a escola ensina de um jeito que eles não entendem. Muitos chegam a concluir o ensino com muita dificuldade, chegam a faculdade e conclui com notas medianas. Outros desistem de tentar, sem nem mesmo investigar o porquê de estar com a dificuldade. O tempo que passam na escola dedicam mais a outras atividades que não sejam aprender o conteúdo das aulas, como socializar com os amigos, tentar se dedicar a artes, música ou aos esportes. Em sala, muitos dormem, fazem piadas ou ficam de conversa paralela, sendo vistos como alunos problemas. Permanecem incompreendidos em suas incompreensões. Se tornam adultos com baixa autoestima e estigmatizados pelo passado escolar e envoltos de uma nuvem de julgamentos que ouviram durante muitos anos da vida e que agora fazem a si mesmos.

Mas há várias formas de se ensinar e de se apreender. Pode-se buscar escolas com métodos diferentes, há a opção de aulas de reforço individuais, que tenham um método que se adeque a forma de aprender do aluno, e ir atrás de investigar o que pode estar comprometendo a aprendizagem. No filme, Teddy acaba descobrindo já adulto que tem dislexia, discalculia e disfunção do processamento das informações! E sua ansiedade na hora das avaliações pioravam a situação, terminando de tirar seu foco das perguntas. 

Por ser um filme de comédia, claro que o método usado pela professora para fazê-lo aprender tem apenas uma função cômica. Entretanto um professor que compreenda a situação e tente adequar o ensino ao aluno faz toda a diferença, mesmo que sejam ajustes pequenos em sala e recomendações de acompanhamentos extraclasse. Então, antes de se julgar incapaz tente se entender. Ao invés de julgar os outros, tente ajudar. O aluno problema é alguém com alguma dificuldade, que nem sempre os professores serão capazes de descobrir. Mas todos temos nossas habilidades e potenciais. Para poder aproveitá-las ao máximo, as vezes precisamos deixar a vergonha de lado e admitir nossas limitações para buscar ajuda. E precisamos aprender que toda habilidade tem seu valor.

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Sheila Francisca Machado reside em Brasília, é psicóloga clínica, especialista em psicologia clínica e especializada em avaliação psicológica, CRP 01/16880. Atende adolescentes e adultos na Clínica de Nutrição e Psicologia - CLINUP. Atua com a abordagem Análise do Comportamento.
Contato: sheila_machado_@hotmail.com
Clínica Clinupclinup.blogspot.com
Instagram@empqnasdoses

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