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Foto: Downtown Filmes / Fala Sério, Mãe! / Divulgação |
A maternidade pode ser vivida de várias formas diferentes e no filme “Fala Sério, Mãe!” (2017) temos a oportunidade de acompanhar um recorte de uma dessas formas. Ângela Cristina se planejou para a sua primeira gestação. Queria estar preparada, se conectava com a barriga, sonhava em como seria ter a filha nos braços, fez diversos cursos e leu bastante sobre o assunto para estar pronta para a maternidade. Porém, quando sua filha nasceu a realidade se mostrou diferente do que ela tinha estudado, apareceram variáveis para as quais ela não estava pronta, mas que interferiram diretamente nos tão sonhados resultados. E no dia a dia ela foi descobrindo que a maternidade romântica só existe nos livros e nos filmes, porque no mundo real é menos glamour e mais noites sem dormir.
Nos primeiros dias com a filha nos braços os desafios da amamentação já se apresentaram. Antes que eles fossem superados foi preciso lidar com a complexidade de se criar uma rotina em casa e para o bebê, junto com as dificuldades de se conciliar o novo papel, ser mãe, com os papéis anteriores exercidos: ser mulher, ser esposa, ser nora, entre outros.
Ao olhar para Ângela Cristina enxergamos a mãe, uma mãe que ofusca todos os outros papéis que ela já viveu anteriormente, e uma mãe solo. Quando a filha dorme pela primeira vez, o pai dorme, mas a mãe fica acordada e só. Quando a filha viaja, a mãe fica, e novamente só. A maternidade na nossa cultura é solitária, os desafios da maternidade não são divididos, a carga mental dos cuidados do filho recai sobre a mãe, que por vezes tem o olhar julgador de outras mães, inclusive da mãe do pai do filho, sobre si. Esse ambiente aversivo torna a maternidade mais solitária e pesada.
Os olhares a sua volta, do esposo, da sogra, de outras mães e até de desconhecidos, tentavam convencer Ângela Cristina da ideia de que a maternidade ficaria a cada dia mais fácil e leve, que não teria mais preocupações e ela iria retomar a vida de antes. Enquanto buscava fazer esse retorno, descobriu-se mãe por mais duas vezes, em gestações que não foram exatamente planejadas, o que exigiu administrar três papéis maternos simultâneos a todos os outros papéis além da maternidade. Com isso, foi enfrentando os desafios de mudanças de rotina, dar um jeitinho nas contas e lidar com os conflitos de ducar três crianças ao mesmo tempo. Acabou se tornando uma mãe super preocupada e superprotetora. As primeiras experiências da filha mais velha lhe causavam muito sofrimento, mas já a auxiliava a entender que precisava aprender a lidar com isso para ser mais fácil quando chegasse a vez dos filhos mais novos.
Cada idade dos filhos era um desafio diferente que precisava enfrentar e nem tudo saia como o planejado. Como cada filho estava em uma fase diferente da vida, mesmo que próxima, as vezes tinha que fazer jogo duplo, para que cada um sentisse como se estivesse sendo o defendido por ela, o jeito que ela encontrou para proteger todos ao mesmo tempo. Tudo em busca de tentar ser a mãe perfeita e criar os laços de intimidade com os filhos que poderiam resgata-la da solitude materna.
À medida que os filhos ficavam mais velhos, por conta de seu jeito superprotetor, acabava cometendo gafes, fazendo os filhos passarem por “micos”. Enquanto Ângela Cristina estava sempre preocupada, até demais, com a segurança e a saúde dos filhos, os filhos viviam despreocupados tentando ter suas experiências, aproveitando o tempo que tinham para expandir seus horizontes. O tempo acabou passando de forma diferente, a depender da idade dos filhos e de como ela estava aproveitando a vida em cada momento.
Com a saída da filha mais velha da adolescência, a relação entre as duas é reconfigurada, surge uma proximidade maior entre elas, a reciprocidade vai ganhando cada vez mais espaço, e, às vezes, aconteceu até dos papeis se inverterem. A hierarquia foi dando espaço à igualdade, entretanto o papel materno é vitalício. Apesar da amizade entre mãe e filha, é esperado socialmente que a mãe seja exemplo a ser seguido pelos filhos e também responsável pelas atitudes deles. Ser um exemplo a ser seguido é uma grande responsabilidade, e a sociedade cobra da mulher desde antes da criança dar seus primeiros passos.
A cobrança social e a responsabilidade materna se enlaçam com os ideais românticos de maternidade, que, apesar de belos, são inalcançáveis e opressores da mulher, o que gera culpa, culpa dos erros que ela e o filho cometem e dos que ela e o filho podem cometer. As vezes a culpa materna vem camuflada de superproteção, em outras gera situações embaraçosas para os filhos, ou pode também ser vivida no silêncio cansado que observa os filhos e o companheiro dormir esperando a preocupação deixar o sono chegar. No caso de Ângela Cristina, é na amizade com a filha que começa a entender que filho adulto toma suas próprias decisões e encara a realidade de que ser mãe é não ter certeza de nada, enquanto que ser filho também.
Não existe mãe perfeita, não existe maternidade romântica! Essas imagens utópicas não deveriam ser metas ou exemplos de maternidade. Precisamos pensar sobre como a maternidade pode ser vivida de forma saudável! Para isso é necessário encara-la em sua realidade, com seus desafios, suas lutas, entendendo que cada mulher vai ter sua forma única de ser mãe, e que é preciso deixar de lado a série de julgamentos que muitas vezes a sociedade faz sem nem mesmo saber o que está acontecendo!
Não existe mãe perfeita, não existe filho perfeito! O que existe são pessoas se construindo e exercendo papéis. Há oportunidades para se transformar, se desenvolver e amadurecer a cada dia. Na maternidade cada vez que o filho cresce e amadurece, ele presenteia a mãe com uma nova oportunidade de crescimento e amadurecimento. Presente que pode, ou não, ser aberto e aproveitado.
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Alyne Farias Moreira, brasiliense do quadradinho, mas refugiada entre a beira do Araguaia e a sombra da Serra Azul. Mãe da Cora Linda, psicóloga, CRP 18/02963, equoterapeuta, professora e palestrante. Apaixonada pelo desenvolvimento humano e por psicanálise.
Contato: (66) 99224-9686 Instagram: @vir_a_ser_Alyne
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Sheila Francisca Machado reside em Brasília, é psicóloga clínica, especialista em psicologia clínica e especializada em avaliação psicológica, CRP 01/16880. Atende adolescentes e adultos na Clínica de Nutrição e Psicologia - CLINUP. Atua com a abordagem Análise do Comportamento.
Contato: sheila_machado_@hotmail.com
Clínica Clinup: clinup.blogspot.com
Instagram: @empqnasdoses
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