American Son (2019)

19 de setembro de 2020

 

Foto: Netflix / American Son / Divulgação

O filme, baseado em uma peça de teatro de Christopher Demos-Brown, de mesmo nome, conta história de Kendra Ellis-Connor (Kerry Washington ), a mãe de um adolescente desaparecido, que luta para encontrar seu filho e precisa enfrentar o preconceito de raça, gênero e classe dos procedimentos policiais padrão durante a busca pelo paradeiro do menino.

A estrutura narrativa do longa é ambientada basicamente em um único cenário, uma delegacia de polícia, com personagens chegando ou deixando à cena conforme a necessidade da trama. É lá onde, nas primeiras horas da manhã, Kendra aparece freneticamente procurando por seu filho, Jamal. Desesperada por respostas, ela desabafa com o oficial de plantão (Larkin), que, do alto dos privilégios conferidos pela sua farda, minimiza a angústia dessa mãe.

Obviamente, há um atrito imediato entre Kendra e o oficial, já que, a partir de suas perguntas elementares para uma mãe palpavelmente perturbada, Larkin vai revelando aos poucos ser totalmente racista e muito denso para ver além de seu próprio gênero e preconceitos raciais, ainda que “faça parecer parte de seu trabalho”, no que é descrito como uma situação bastante enervante que clama por sensibilidade.

O oficial Larkin, enquanto aparentemente tenta apenas colher mais informações sobre o caso, questiona Kendra sobre seu filho, como a aparência do garoto. Entretanto, ele parte de preconceitos e estereótipos para fazer as perguntas, presumindo, apenas pela cor da pele da mulher, que o jovem pode ser membro de uma gangue. Irritada com o tipo de pergunta ela defende a integridade do filho, o que faz o oficial ficar repetindo à exaustão que entende o drama da personagem, alegando que também tem filhos, mas ouve um questionamento que o confronta com a realidade: “Algum deles é negro?”.

À medida que a investigação avança, tornando-se cada vez mais tensa. Pedaços da vida de Jamal são revelados, o que nos resumem, ele é um bom garoto. Fornecido com a melhor educação que seus pais prósperos e agora separados podiam pagar, ele foi criado para acreditar que, apesar da cor de sua pele, ele pode desfrutar de todos os privilégios que são inatos para as crianças, na maioria brancas, com quem ele cresceu. Agora, enquanto preocupada em uma delegacia de polícia, Kendra está chegando à conclusão de que, mesmo com tudo que ela e seu ex-marido fizeram para posicioná-lo adequadamente em um mundo que pode não ser gentil com aqueles que se parecem com ele, seu filho negro só pode ter se tornado outra estatística.

Visivelmente alterado pelo desespero daquela mãe, o oficial Larkin se sente aliviado quando, em determinada cena, vê um homem que carrega um distintivo entrar na sala. Pensando ser ele um superior responsável, o policial conta a ele sobre a "vadia totalmente fora de controle" na sala de espera, que muito rapidamente “passou do zero ao gueto”, criticando as atitudes de Kendra, esperando encontrar apoio. O homem em questão é Scott Connor (Steven Pasquale), agente do FBI, branco, de olhos azuis e também pai do garoto desaparecido. O pré-julgamento dele sequer considerou esse laço com Kendra e o adolescente.

A dinâmica do filme muda novamente quando John Stokes, um veterano oficial, finalmente entra em cena, oferecendo seus próprios insights antes de levar a história ao clímax. Entretanto, a presença dele é complicada, pois, assim como Kendra, ele também é negro. E assim, ele se sente à vontade para falar francamente com uma mãe angustiada e chamá-la de "minha irmã", lançando bombas de verdade sobre as realidades das relações raciais na América que aparentemente são reveladoras, mas são datadas e tolas.

O filme se trata muito mais do que apenas uma história sobre a angústia da maternidade, ou o sumiço de um adolescente. A questão crucial é o racismo impregnado em uma sociedade que insiste em minimizar ou negar a existência dele. Espera-se que o público fique tão sobrecarregado com a gravidade do assunto (os assassinatos injustificados de homens negros nas mãos de policiais, muitas vezes brancos, que são normalmente considerados irresponsáveis) que não notem a monotonia dos personagens e o quão superficiais e agonizantemente manipulativos, seus debates ostensivamente tensos são sobre racismo, classe, violência policial e injustiça.

Além disso, como a única mulher no filme - uma mulher negra - em confronto com homens em posições de autoridade que rejeitam suas observações contundentes sobre raça, a história de Kendra é uma oportunidade de criticar um sistema patriarcal que tenta abafar as vozes das mulheres.

American Son não é um filme fácil para aqueles que esperam ação e movimento, ele é bem mais concentrado nos textos e nos atores, mas vale a pena dar uma chance a essa proposta, que proporciona uma importante experiência de reflexão.

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Wilgna Maria Melo Costa, CRP - 22/02863, Psicóloga, especializada em Avaliação Psicológica e Psicodiagnóstico, com curso de extensão em TDHA e Desenvolvimento Humano. Atua com base na Terapia Cognitivo Comportamental e oferece atendimento para todas as idades.
Instragram: @wilgnamelo

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