Amor com Data Marcada e o medo de se relacionar

29 de dezembro de 2020

 

Foto: Netflix / Amor Com Data Marcada / Divulgação

Imagine chegar em casa para o natal e todos seus familiares te perguntarem se você ligou para uma pessoa que eles arranjaram para você sair? Ou conhecer uma pessoa e sair alguns dias com ela só para ter com quem passar um feriado? Bem, é assim que conhecemos Sloane e Jackson em “Amor Com Data Marcada” (2020). Sloane está superando um final de relacionamento em que seu ex-namorado a trocou por uma pessoa mais nova. Com isso, sua família tem tentado arranjar um novo pretendente para que ela não fique sozinha para o resto da vida. Sua tia Susan, que também está solteira, tem uma tática e ensina a sobrinha: algo que ela chama de “ferigato”, arranjar um encontro com alguém aleatório só para levar um acompanhante para a datas comemorativas.

Apesar de achar a ideia absurda no começo, ao ir no shopping trocar o presente de natal acaba conhecendo Jackson, que também teve um natal bem diferente do que o esperado e estava lá para devolver o que ganhou. Jackson foi para a casa da família de uma mulher com quem estava no terceiro encontro e, mesmo deixando claro que ainda não tinham um compromisso, ele foi tratado como se já fosse da família, recebendo até um especial de presente de natal. Sloane e Jackson acabam conversando sobre suas noites fracassadas e ela conta a ele sobre a dica de sua tia. Achando a ideia interessante, Jackson combina com ela um encontro de ano novo. Quando se encontram novamente no dia dos namorados, acabam combinando de serem o acompanhante um do outro durante todas as datas comemorativas até mudarem de ideia.

Nesse começo de filme já vemos algumas regras generalizadas na sociedade sobre relacionamento sendo apresentadas: a ideia de que uma pessoa só pode estar feliz e completa se estiver em um relacionamento sério, relacionamentos sérios são um fardo e problemáticos, estar solteiro é algo ruim e relacionamento fixo sendo um sinônimo de sucesso na vida. Não é à toa que atualmente tantas pessoas tem receio de se relacionarem. O namoro hoje tem um status de seriedade tão grande entre as pessoas, passando a ser considerado um compromisso que só podemos assumir depois de conhecer bem outra pessoa, que a ideia de que o namoro é justamente o período em que estamos conhecendo o outro melhor tem se perdido. 

Muitas pessoas têm preferido não “rotular” as relações como forma de se proteger de frustrações ou como forma de negar os próprios sentimentos. E é nesse espírito que vamos acompanhando a jornada de Sloane e Jackson no decorrer do filme. A cada feriado eles se conhecem um pouco melhor, vão desenvolvendo intimidade um com o outro e evitando falar sobre sentimentos por medo do que a relação possa vir a se transformar caso os dois desenvolvam seus sentimentos. No meio tempo, acabam passando algumas dessas datas com a família de cada um, o que por regra social pode dar uma conotação de seriedade a relação.

Enquanto isso, eles acompanham os relacionamentos dos amigos e familiares: um amigo mulherengo de Jackson, que está sempre com uma pessoa diferente; a tia Susan, que evita se envolver dando só um feriado de chance para cada encontro; o irmão mais novo de Sloane, que em poucos meses começou o namoro, noivou e casou a ponto dele e a esposa acharem que talvez foi rápido demais, pois ambos ficaram sem se conhecer muito bem; e a irmã de Sloane que, por conta da rotina com quatro filho, não tem tido mais tempo com o esposo para viver a vida em casal. Essa visão de relação como algo imperfeito só reforça para eles a ideia de que é melhor não se comprometer, mantendo neles a visão de que existe o relacionamento ideal e ele é impossível de ser conquistado.

Aos olhos dos dois, os relacionamentos sérios eram muito complicados, e, entre um drink e outro do envolvimento sem compromisso, a vida parecia leve, pelo menos até começarem a perceber que entre feriados cada um tinha uma vida separada e com chances de se apaixonar por outra pessoa. Não rotular como uma forma de negar a existência da relação estava complicando mais do que facilitando o relacionamento. Discutiam sobre as máscaras que percebiam os outros usando para estarem em uma relação e se viam cansados das normas do que pode ou não pode acontecer nos primeiros encontros por conta do que o par vai achar. Estavam cansados das expectativas e ser o acompanhante do feriado parecia mais simples do que assumir algo sério. Porém, estavam usando um tipo de máscara: uma muralha construída ao redor de si para não permitir ninguém realmente se aproximar.

Pouco importa o nome que se dê: crush, date, affair, caso, casinho, ficante, rolo, flerte, paquera, amigo(a) com benefícios, pretendente, namorico, namoro, ou qualquer outra expressão, o relacionamento é um laço que duas pessoas decidem criar por vontade própria, por quererem estar juntos, e sempre vai começar com a fase do se conhecerem melhor! O importante é não usar máscaras, baixar pelo menos um pouco as defesas, ser sincero e deixar o outro conhecer quem realmente somos e não a imagem que queremos que veja e que não seremos capazes de manter a longo prazo. Precisamos conhecer um ao outro sem a máscara para realmente nos aproximarmos. 

Também temos o direito de estar solteiros e plenos, sem manter vínculo, desde que esteja claro para as pessoas que saímos que não haverá uma próxima vez. Se sentir bem consigo mesmo(a) não tem tanta relação com o ter alguém especial como muitos pensam. Estar bem consigo mesmo(a) é se amar, sermos especiais para nós mesmos, independentemente de haver um outro alguém. A dois ou a sós, ser respeitoso(a) e verdadeiro(a) faz toda a diferença, é a reflexão que temos acompanhando a jornada de Sloane e Jackson.

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Sheila Francisca Machado reside em Brasília, é psicóloga clínica, especialista em psicologia clínica e especializada em avaliação psicológica, CRP 01/16880. Atende adolescentes e adultos na Clínica de Nutrição e Psicologia - CLINUP. Atua com a abordagem Análise do Comportamento.
Contato: sheila_machado_@hotmail.com
Clínica Clinupclinup.blogspot.com
Instagram@empqnasdoses

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